EM BUSCA DA FELICIDADE
Ao aceitar o convite de empresários amazonenses para apresentar na Avenida o enredo “Parintins, a Ilha do Boi Bumbá”, o Salgueiro fez, em 1997, uma excursão a Manaus, levando uma trupe de 100 sambistas, entre ritmistas, passistas, casais de mestres-salas e porta-bandeiras, baianas, destaques e convidou vários jornalistas. Mas, na hora do embarque, só havia dois no aeroporto: o escriba que vos fala e o intrépido JCN – ou José Carlos Netto, se preferirem.
Desembarcamos em Brasília às 19h, onde aguardaríamos um novo voo para Manaus por volta de 23h. O que fazer para fazer o tempo passar durante quatro horas de espera? O intrépido JCN saiu pelo Aeroporto Internacional de Brasília em busca de uma resposta. E não demorou para encontrá-la.
Voltou minutos depois, acompanhado de um sujeito baixinho, barrigudo, bigodudo e de pernas finas, que usava um chapelão branco, de caubói, totalmente desproporcional à sua modesta estatura. E o apresentou:
– Pessoal, este aqui é o Baixinho, lá de Ilhéus, na Bahia. É salgueirense roxo!
O Baixinho era proprietário de três fazendas de cacau. Tinha as bochechas vermelhas, da cor da bandeira de sua Escola:
– Salgueeiro!!! – punho cerrado, levantou o braço, saudando os ritmistas, convidando-os para uma rodada de chope, por sua conta. E antes que os copos esvaziassem, comentou: – Adoro o Explode, Coração!
Os batedores tiraram dois ou três instrumentos das capas. Quinho cantarolou:
Lá vou eu/ Me levo pelo mar da sedução/ Sou mais um aventureiro/ Rumo ao Rio de Janeiro/ Adeus Belém do Pará/ Um dia volto, meu pai/ Não chore, pois vou sorrir/ Felicidade, o velho Ita vai partir…
O Baixinho ficou emocionado. Perdeu o controle do volume de voz:
– Desce outra rodada aí! Salgueeeiro!!!
Os seguranças do aeroporto tiveram que intervir em nome da ordem. Pediram para a turma guardar os instrumentos e parar de cantar, o que deixou o Baixinho indignado. Já havia perdido dois voos para a Bahia – um para Ilhéus e outro para Salvador – e quando reencontrou a felicidade, eis a censura, a opressão!
JCN tentava contemporizar, mas o coração salgueirense do Baixinho carecia de novas emoções. Talvez, por isso, tenha decidido:
– Vou para Manaus com vocês!
Os batedores de Mestre Louro vibraram. O Baixinho rumou na direção do balcão para remarcar a passagem, mas não se esqueceu de mandar descer uma nova rodada.
Foi no balanço das ondas, eu vou/ No mar eu jogo a saudade, amor/ O tempo traz esperança e ansiedade/ Vou navegando em busca da felicidade…
O samba-enredo parecia traduzir um momento de angústia na vida do fazendeiro, agora rodeado de passistas e… tulipas. JCN tentava controlar o ímpeto do amigo recente, que não parava de beber. Mas teve que atender ao chamado dos alto-falantes para o novo voo, pois o avião já nos aguardava na pista. Pegamos malas e bagagens e partimos, sem perda de tempo.
Minutos depois, já no interior da aeronave, perguntei ao intrépido:
– Ué! Cadê o Baixinho?
Zé Carlos deu um tapa na testa:
– Ih, cacete! Perdeu o voo novamente.
(Na foto de Benildo Mendes, o diretor de harmonia JCN nos braços da Estação Primeira, a sua grande paixão)
Texto de JCN releitura de Cláudio Vieira